Laís é uma criança dócil, bem humorada e sorridente. Não é só minha opinião de mãe coruja não, juro. É unanime. Eu brinco com ela que existem dois tipos de pessoa no mundo “as que te amam e as que não te conhecem”. O que absolutamente não impede que ela já tenha entrado naquela famigerada fase dos faniquitos.
O pior dos faniquitos é nunca saber o que será o estopim do próximo. Tem um desenho animado recente, acho até que é do Spilberg, daquele “pacote” dos animanics e Pink e o Cérebro, chamado Kate Kaboom. A Kate é uma adolescente doce é meiga que vira um monstro verde que destrói a casa e o quarteirão quando algo extremamente grave a tira do sério, como uma espinha por exemplo.
No caso da minha Kate Kaboom existem dois tipos de faniquito.
O primeiro é o que começa aos poucos e em geral acontece dentro de casa, quando algo a irrita como um lego que ela não consegue encaixar ou uma luva de borracha que não consegue calçar. Aí ela começa assim:
- Hamm!Hamm! HAMM! (cada vez mais alto) ÁÁ! ÁÁ! ÁÁ! ÁÁÁÁÁ! Esse último "ÁÁÁÁÁ" já é um berro agudíssimo e em geral a hora que eu costumo a intervir:
- Ei! Eu pari uma criança ou uma arara? Que que tá acontecendo aqui? E ela:
- Não consigo! Não consigo! (em tom de desespero como se fosse me salvar da forca)
- Calma, não consegue o que?
- A luva! Não consigo, não consigo!
- Calma! Dá aqui que eu ajudo. Pronto!
Calço a luva, o sorriso volta e voilá! Acabou o drama.
O segundo tipo é o que eu chamo de “faniquito clássico” e óbvio, só acontece na rua, em frente a diversas testemunhas.
O faniquito clássico começa assim: você sai na rua com a criança sem carrinho porque só vai logo ali e já volta. Depois de 40 minutos deixando-a fazer o que quer correndo de um lado pro outro você decide que já basta porque é hora de tomar banho jantar e coisa e tal e diz:
-Agora vamos né?
- N-Ã-O!
- Vamos sim, tá na hora de papar!
- Não! Vou papá não!
- Vai sim, já está na hora. Vamos!
- N-Ã-O vamos N-Ã-O! Esse segundo não já é histérico e acompanhado daquele pequeno ser se jogando no chão com as lágrimas rolando em profusão, batendo veementemente os pés e as mãos ao mesmo tempo e gritando entre soluços frases completamente incompreensíveis aos ouvidos destreinados (mas que eu entendo perfeitamente “quelo papá não! quelo i pá casa não!”).
Todos os olhares em volta recaem sobre você, que sabe exatamente o que todo mundo está pensando: “coitada da criança. O que será que essa megera fez?” Aliás, todo mundo não. Tem quem pense: “credo! Que criança mais mal educada! Se fosse meu filho eu dava logo um jeito”(eu garanto: todo mundo tem jeito pro filho dos outros).
De um modo ou de outro, você é sempre uma bruaca incompetente e ponto final.
Você fica ali entre a vontade de fingir que não faz a mais vaga idéia de quem pariu a criatura e ficar disfarçadamente olhando vitrines, e a vontade de levantá-la do chão na marra e se reclamar ainda tascar-lhe uma palmada que é para ter motivo de verdade pra tanto choro.
Refreando todos os impulsos, você se agacha (porque segundo os educadores você intimida a criança falando com ela do alto) e tenta paciente e carinhosamente convencê-la de que amanhã tem mais, e ainda por cima tem uma sobremesa-surpresa-de-chocolate-super-legal etc...
Há que se ter muita calma nessa hora. Respiro fundo, peço a Deus só um pouquinho mais de paciência e, por fim, o truque da sobremesa cola. A criança levanta, para de chorar e a audiência já pode arrumar outra coisa pra se distrair e comentar em casa mais tarde.
À bruxa (eu, claro), só resta engolir em seco e resignar-se. Porque afinal, na maior parte do tempo a criança é mesmo dócil, bem humorada e sorridente.
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